sábado, 31 de maio de 2008

Não há escrito sem dor. Cheguei a essa conclusão hoje. Como sempre, parto do óbvio para chegar a algum lugar. A experiência de ser agraciado por mais um amanhecer, mesmo que o de hoje seja o último, é repleta de dor. Ao menos para quem pensa e tenta entender a significação de estar acordando. Buscar ganhar mais dinheiro? Cuidar de alguém? Estudar mais? Quem é capaz de acordar e pensar: “hoje vou me esforçar para sorrir mais.” Não há tempo pra isso, além de que também seria uma péssima representação. Por isso, não há escrito sem dor. Para escrever, compor música, fazer arte e expressar o que é ser humano, o que é existir é preciso ver-se aqui, neste palco diário de máscaras conscientes. E ainda assim não é fácil possuir consciência, e realmente ver-se aqui. Mesmo que para uns ela distribua-se apenas em neurônios (pobres tacanhos) e para outros existam também estruturas egóicas, paranóicas, estrambóicas... Não interessa, ser humano é sempre fazer doer. Mesmo ser feliz é dor, já que sempre acaba e voltamos ao ponto inicial. Ao contrário do que possa parecer este não é um escrito depressivo, é apenas uma constatação. Um desabafo também, afinal hoje não falei com ninguém – além da conversa sobre o tempo com o taxista que me trouxe até onde moro.

TOUCHÉ! Me entreguei aos constatadores de obviedades, sempre ávidos por mais uma certeza absoluta para sua coleção: “ele está só, é óbvio que ele deveria ficar assim.” Parabéns, podem guardar mais esta em sua coleção! Mas advirto-vos, é falsa. É ouro-de-tolo. Minha dor sou eu, e, caso não possuam essa obviedade da física em seu arquivo de coleção, aí vai: não consigo separar-me de mim. E isso vale pra você também. Acompanho-me a todos os lugares, independente das outras companhias – familiares, amorosas ou de amigos. Sou dor o tempo todo. Contrario as expectativas porque não quero ser o que você entende por feliz. Não quero ser outro. Gosto assim, de saber que sou humano e incapaz como todos vocês – distante de considerações acerca de acúmulo de capital. O dia que ser gente for ganhar mais dinheiro as indústrias farmacêuticas quebram, junto com os traficantes de drogas ilegais. Aliás, bem semelhantes estes dois grupos: uns no morro e outros no escritório, uns com armas e outros com canetas, ambos vendendo felicidade. É difícil existir, para todos. Saber o que é ser humano e ser sempre dor. As drogas são convidativas, principalmente quando prescritas pelo médico.


Voltando ao que dizia antes, seja bem vindo a mim. E lá vem mais um amanhecer, ganhei do acaso outro dia para ser eu mesmo. Bom dia!

Feira


Agora lembro
Daquelas caixas de frutas
Todas lindas, realmente preciosas
Mas gritadas por estúpido feirante

Pechincha fazia
De tuas uvas vúlvulas
Das maçãs do teu rosto
Destes cachos de teus cabelos

Feirante ainda soltava, como em refrão
Leve tudo! Está na promoção!

Mas não queria
Só teu dedo-de-dama
Já me completava a prataria.

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Tic Tac


(para ser lido no ritmo dos ponteiros do relógio)


Recorta
Cola

Recorta
Cola

Pêndulo exato

Tiro daqui
Coloco em ti

Recorta
Cola

Pedaço meu contigo está
Ou este era teu?

Já não entendo
O que era teu ou meu

De tanto

Recorta
Cola

Somos tantos eu em ti ou o inverso
Tornamo-nos um.
E agora, o que faremos se somos dois?

Recorta?

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Molde


Vida programada
Sem possibilidade de parada
Dessa suspirada
Palavras travadas
Línguas dadas
Mudez gritada

Meu sertão
Ressequido ourives
Há muito diz não
Se meu pedido ouvires
Não te nego fabricação

Alianças em ouro
Sócios perfeitos
Gritam em coro
Chuva no sertão desfeito!

quarta-feira, 28 de maio de 2008

É agora

É pra hoje
Amanhã é tarde

Melhor,
É pra agora
Depois pode escapar

Um beijo
Agora, exigente

Nos conhecermos é detalhe.
Depois
Amanhã...
Não. Agora!

Depois é tarde demais,
Já saberemos o que somos
Sem mágica.
Inevitável
Beijemos agora
Na sofreguidão que a mágica exige

Depois conversamos
E descobrimos, juntos, se um ao outro suportamos.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Secreta

Porta aberta
Dessa morte em vida certa
Acaso de estar
Sem razão de chegar

Objetivos nenhum
Sorrisos, alguns
Morte certa
De boca aberta

Junta esse lixo
Guarda teu regozijo
Em mim teu escárnio
Teus lábios sem boca exijo

Fica aí aberta
Nesse sexo secretas
Minhas noturnas mortes certas.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Uma Breve Parada!


Queridos!


Não, este não é mais um poeminha para o blog. Na verdade é um recadinho e um grande agradecimento. Nos próximos 5 dias, até segunda-feira, estarei viajando e não poderei realizar as postagens diárias como venho fazendo há pouco mais de um mês. Por incrível que pareça, além de você que está lendo agora, algumas outras pessoas também me visitam por aqui regularmente!

Já que estou conversando um pouco, solto das estrofes, gostaria de agradecer muito ao incentivo da querida Cae pela idéia do blog e pela motivação constante em seguir as postagens! Sem o "pontapé" inicial dela este blog não existiria! Agradeço também a grande amiga Nunila pelos elogios, valeu! Graças a ela vou participar do 1o. concurso de poesias da minha vida... Sei lá o que vai dar, mas só o exercício já foi ótimo! E a todos, poucos mas constantes, que visitam regularmente o blog, obrigado pela leitura.


Encerrando: para Nietzsche, assim como nossa pele serve para conter e proteger músculos, ossos, vísceras e carnes, a vaidade é também uma pele, mas da alma - uma contenção e conjuntamente uma proteção essencial. Sem vaidade a alma não possui razão de existir. Longe do tom pejorativo, vaidade aqui é a importância do reconhecimento, mesmo que mínimo, de nossos atos enquanto humanos. Sem a leitura de outras pessoas, este blog não possuiria razão, não teria (como possui) minha alma escrita. Obrigado a todos!

Imensurável

Mas é à beça
Muito, demais
É superlativo que não cessa
Sempre mais e mais

Sem limite
Exagerado e grande
Não duvide
Nem mesmo mande

Fique e admire
É portanto imenso
Atenta, não vire
Respeite um amor sem senso.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Reverso


Palavras simplórias
Simples histórias
Ai essas memórias
Aqui em linha ilusórias

Não sinto inteiro
A linha entre teu cheiro e o travesseiro
Nem a espera do carteiro
Aqui em linha até isso se faz ligeiro

Monto as linhas
Como quando vinhas
E nas mãos minhas
Vida tinham estas linhas

Agora é só rima
Ausência de ti em cima
Linhas finitas que a mão não atina
Pois teu corpo espero toda matina.

Não vens, senão me quebra a rima.

domingo, 18 de maio de 2008

Jocosa Vida

Insana
E, graças aos céus, profana
A vida é mesmo engraçada
Mas vamos à piada

Hoje assim que mirei
Que a ti ladeava
Juro, até empertiguei
Ao menos um olhar esperava

Mas distraída estavas
E aí o clamor da vida desgraçada
Pois ao chão te inclinavas
Para pastar agachada

Não tive como ver outra figuração
Te ver cheia de prazeres
Tu, depois de a mim tantos nãos
Agora aí ardes, cheia de domésticos afazeres.

Parabéns,
Agora és teu sonho
E o pasto, é de agrado ou se faz medonho?

sábado, 17 de maio de 2008

Realejo


Realejo ingrato dessa relação


Não toca nossa música


E a carta nunca sai coração



E nem a carta é coração,
Asno!
É copas.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Repetição


Mesmas tolices ouvi ontem
Ou foi quando?
Sei que não respondem
Teus anseios de desmando

Ontem ou com outra
Já ouvi esses disparates
Não me importa se de tua boca ou doutra
Este ouvido hoje maltrataste

Proferindo, assim como ontem
Ou como a outra
Palavrinhas de ordem
Sentenças de baixa choldra

Onde já se viu
Encurtar o pavio
Só porque não hesitei
E outras virilhas visitei?

Relaxa as pernas meu bem
Silencia a boca
Se não queres ir além
Ao menos te faz rouca

Cansei disso
Terminou, linda constatação
Fim desse compromisso.
Vamos dormir então.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Agreste


Agora é isso
Boca seca
Antes nervosismo
Agora ausência
Boca molhava em tua saliva
Agora seca quando vê
E são só lembranças
Fartas do que já houve
Gritos e gemidos de outrora
Preenchem a madrugada da memória
E a boca vai secando
Sem tua saliva
Seca em respiração ofegante
Cruz solta
Calvário incessante

Só, nem permaneço em mim
Teimoso insisto em estar aí
Ao lado teu, atrás de um sim.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

A Ribeirão Preto


A estranheza que essa cidade causa
Aos meus passos desdenha
Por mais que por aqui faça pausa
Minha personalidade desenha

Cada esquina que passo
Não há registro na memória
Nem mesmo um saudoso abraço
Nada faz parte da minha história

Estranha rudeza
Sinto a cada rua
Pelo menos não há tristeza
Nessa terra vermelha e nua

Encravada no canavial
Centro de coisa alguma
Apenas não me faça mal
Dê a chance, ao menos uma

Sinto que pertenço a nada
Nem a ti vermelho pó
Nem a minha distante terra dada
Por este tempo aqui vivo e só
O futuro guarda outros urbanos
Por isso aqui não faço planos

Apenas me sirvas
Esquisita ilha
De mordaça viva
Desse sorriso meu que pilhas

Mas espera que me esmero
De mim não roubas
Este último riso sincero.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Genética


Esses genes que aqui estão
A formar meu corpo, minha mão
Será que já fui preto, branco?
Ou quem sabe manco?

Sem resposta ainda fico
Não sei se mulher ou milico
Só sei que gene de tristeza
Não deve ser da natureza.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Um Dia


Risadas ouvi
Mesmo que não quisesse
Caçoando te vi
Dizendo que merece

Tudo bem
Pode até ser
Eu fico sem
Pra que possas ter

Mas escuta este aviso
Quem de alguém tira
Mesmo que de improviso
Em algum momento de lado se vira

Estarei lá
Quando tal dia chegar
Aqui ou acolá
O sorriso que de mim tiraste, de volta vou pegar.

domingo, 11 de maio de 2008

Em Conjunto


Sente o que de mim exala
Segue-me viva
Apenas anda e te cala
Vem como sempre, altiva

Assim pode ser
Altiva e calada
Deixe o sorriso correr
De felicidade fique armada

Só peço mudez
Não por negar opinião
Chegará tua vez
De declarar essa união

Agora o dito me pertence
Teu olhar a mim convence
Sem rodeios afirmo
Essa estrada é tão segura quanto nestas frases rimo.

Ajuste teus pés
Estrada conjunta, minha e tua
Já a traçamos em viés
Por favor, a considere tão minha quanto sua.

sábado, 10 de maio de 2008

Impassível


O horizonte é linha, imutável
Eu não, torto me distorço todo
Contorcionismo de ser
Fumaça de mim sai
Sofrimento fica
O crepitar do cigarro acompanha
A batida dos passos
Em mim algo que não viste
Em ti algo que não sinto
Ausência de ambos
Abertura frágil dessa existência pífia
Dia a dia esse martírio de sorrir
Recorro a um eu que não estou
Não quero ser esse
Que torto, observa o horizonte
Impassível, sempre contrariamente tão reto.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Primaveril


Que não te deixe prosa
Meus versos assim
Considere-os uma rosa
Que cheire a jasmim

É que assim me faço
Um perfume diferente do esperado
Sinto nesse abraço
Me preferes assim, diferente, mas ao lado

Fique tranqüila
Mesmo que esse jasmim
Amanheça em outra vila
Florescer, só faz em teu jardim

Por isso não o colhas
Não é ornamento
Nem mesmo pode suas folhas
Só as preserve do vento

Ele não fica bem à mesa
Rosa jasmim assim chama
Não precisa ficar tesa
Apenas o deixe próximo de tua cama.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

É a maneira


Eu espero
Sincero
Que em mim não queiras
Só carícias ligeiras

Que de mim esperes
Beijos de halteres
Pesos de mãos
Que segurem com força teus nãos

Que impeçam tua fuga
Covardia de outras histórias
Minha mão dessa lapela enxuga
Choros tristes de tuas memórias

Vem comigo
História nova, original
Eu contigo
Dentro de ti, pela vicinal.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Farra e Despedida


Roço nesse corpo molhado
Noite passada foi meu
Contigo ralho
Pra te mostrar que sou eu

Vai te indo
Que fico eu
Só ouvindo
Esse lugar é meu.

Agora é adeus
Sem luz sem janela
Junta os teus
Só despedida dela

O domingo em pó
Não desespero com chuva
Ficar aqui só
Depois da noite em curva

Romance não arranho
Hora de ser mal
Não enche, sai desse banho.
Tchau!

terça-feira, 6 de maio de 2008

O Encontro



Não há como escapar ileso
Ao encontro consigo mesmo
Se aqui não percebes de que falo
Longe estás do teu próprio halo

Se pensas que estás aí, sempre contigo
Que teu eu é em ti mesmo abrigo
Engana-te redondamente
Teu eu está longe da mente

Esse convosco que por aí mostras
Esse tu que aos outros eleva ou prostras
Não passa de teu papel
Teu eu atrás está desse véu

Não saio incólume daqui
A mim encontrei e vi
Não conhecia
Não via
Meu eu rasgou o véu
Se desfez de mim de papel
E agora pega as rédeas da situação
A tudo assume sem me consultar a ação

Desculpem as agonias
Daquele eu que imaturo vias
Fato é que desconhecia
Que em mim, outro vivia.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Fim


Imortalizo a solidão
Em preto e branco
Cores presentes nos dias que foram
Cinzas depois do fogo
Um dia extingüe
É assim
Lei natural
Um dia acaba
Um dia



Acabou.

domingo, 4 de maio de 2008

Mudança




Agora quero linhas felizes
Chega de escrever insucesso
Mesmo que seja beijo de atrizes
Mesmo a esses quero acesso

Pode até ser fingimento
Aceito qualquer uma
Mesmo beijos de cimento
Quero toques de quem não se arruma

Velhas, feias ou belas algozes
Me importam que sejam mulheres
E com elas goze
Quero comer sem talheres

Grosseiro pensamento?
Não amigo
O fato é que não sou ciumento
Que todas em mim façam abrigo.

sábado, 3 de maio de 2008

A Ela


Amordecer os olhos
Vendar a boca
Te levo os óleos
Te largo louca

Me enjoa a pele
Me bronzeia as vísceras
Só não apele
Desse corpo as carnes míseras

Níqueis de calor
Hímen antigo
Nesse poema horror
Encontrou abrigo.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Coser


Jargões e clichês
Quantos eu te amo
Sempre em crochês
Repetimos os pontos todo ano

Mudam as linhas
Outros egos vêm
A outro ponto te alinhas
Mais um pra chamar de bem

Vida de eterno coser
Furto superficialidades
A outra prometo ao lado morrer
Mostro minhas qualidades

Cega costura
Crochê alcoviteiro
A emoção é pura
A outra enterro, feito coveiro.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

O bêbado e sua fêmea


Vazia garrafa
Parceira de dança
Do bêbado abafa
Fêmea de vidro, não cansa

Alcoolizado a beija
A agarra a noite inteira
Mil fêmeas almeja
Mas só, fica na ladeira

Nesse leito de rua
Feito um só dormirão
Amantes, sua fêmea vazia e nua
Abraçados, vidro e homem se completarão.